É Páscoa: Alegrai-vos, Deus está no meio de nós

Quando criança, eu (João) tinha a ideia, infantil, fantasiosa, de que Deus era um homem velho, de longa barba e cabelos grisalhos, muito grande e forte. Tão forte era Ele (Deus), que podia aparar com suas mãos todo o planeta, e assim, protegê-lo. Colhia essa imagem de um quadro que minha bisavó, Capitolina, deixava sobre a sua cama, no quarto em que dormia.

Até pouco tempo atrás, já adulto, atordoado pelos problemas do mundo, ausente do exercício diário da fé, continuava eu a manter uma ideia de Deus distante. Não mais de um Deus homem, mas agora de um Deus força: Força suntuosa, sobrenatural, protetora da Terra e longe das minhas condições humanas – longe de frio, de sofrimento, de angústia. Um Deus que tinha maiores preocupações – como o organizar das órbitas dos Planetas, a evolução das espécies, ou as guerras e grandes conflitos – e, portanto, não teria tempo para mim.

Hoje, ainda que vendo em parte, não em face, tenho outra compreensão de meu Pai. Tenho tal compreensão por que vejo Deus, sinto Deus, converso com Deus, vivo Deus. Recebi de Deus uma mão estendida, uma vida nova.

Deus, para mim, não é aquele que, assim como propõem algumas ideologias, é fruto de uma invenção humana para suprimento de suas próprias carências; ou está morto, ausente de nossa dor – seja porque o enterramos, seja porque não existiria; ou é mera energia construtora das coisas.

Também não é Deus, assim como propõem algumas e alguns, o ser que está acima de todos, pronto para o castigo, para a repressão, para a punição.

Deus é Jesus. Deus é Cristo que se faz homem – homem de carne –, e que como homem viveu e sentiu as nossas aflições.

Deus é Aquele que nasceu na manjedoura, filho de pobres, sem lugar na hospedaria, sem uma casa para se assentar – assim como tantos irmãos nas ruas, meus e seus, agora se encontram.

É Deus quem foi refugiado, no Egito, junto a seu pai (José) e sua mãe (Maria), para que sua vida fosse preservada da ira dos que tinham fome de poder e de riqueza – assim como tantos ucranianos, sírios, bolivianos, palestinos e senegaleses.

O mesmo Deus que viu as nossas faltas, as nossas demandas. Que esteve no deserto por quarenta dias, quarenta noites. Que foi tentado, sentiu fome, sentiu sede – Tal como você, meu irmão, que passa por dias difíceis.

Um Deus que não só viu as nossas faltas, mas saciou-as. Multiplicou e deu pães e peixes; curou doentes; fez cegos voltarem a ver – e continua a fazer o mesmo.

Deus que foi aclamado, recebido com cantos, com ramos, com tapeçarias. “Hosana”, gritaram. Fizeram assim como nós fazemos, honrando todos aqueles que fazem o bem, tantos bons homens que nessa Terra já passaram.

Não bastasse tanto, Deus doou-se. Ensinou o serviço e a entrega. Amarrou uma toalha sobre a cintura, tomou água e uma bacia, e lavou os pés dos seus. “Façais igual a mim”, disse Ele. Foi exemplo para Irmã Dulce, que aos necessitados serviu até a morte.

Acontece que Deus também foi traído. Beijaram-Lhe a face e de bandeja deram-Lhe aos homens que mal queriam-Lhe. Despiram-No, cuspiram-No, roubaram-Lhe as vestes. Açoitaram-No, humilharam-No, reprimiram-No pelo “bem”. Usaram com Deus da mesma perversa perseguição que sofreram Pedro, Paulo, João Batista e tantos mártires que pelo Amor se foram.

Deus, no entanto, não tomou raiva. Antes disso, sabendo que isso ocorreria, fez-se presente no pão e no vinho. Deu-se alimento, como leite e mel. Faz isso até hoje, visitando-nos, preenchendo-nos, com a Eucaristia que o Sacerdote apresenta e consagra sobre o altar.

Por fim (não sendo esse o fim), Deus, passou pela entrega final, pela morte. Sentiu o medo, sentiu o vazio, sentiu o que sentirá todo o ser humano que hoje está vivo e lendo esse texto. Então, perdoou os seus, suspirou, exalou e entregou seu espírito. 

Por não ser esse o fim, Deus venceu a morte. Redimiu os homens da escuridão, das trevas. Implodiu o mal e devastou-o. Mostrou que nada nem ninguém é maior que o Nome que sobre todo o Nome prevalece. 

Essa, meus irmãos, é a Páscoa do Senhor. A passagem para Nova Aliança. A Páscoa dAquele que está aqui, neste nosso diálogo. DAquele que se faz presente quando dois ou mais se reúnem em seu nome. DAquele que abriu o mar; dAquele que calou a tormenta. Alegrai-vos: Deus está no meio de nós.

A todos, uma santa e abençoada Páscoa. Paz e bem!

João Marcelo e Nathalia